quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Sem vergonha de respeitar

Quando pensamos em uma sociedade desenvolvida, logo nos vem à cabeça o bom nível de vida da população decorrente de boa estrutura de saneamento, saúde, educação, transporte, etc.
No entanto, ao observar essa sociedade no dia-a-dia, características mais simples nos causam estranheza. Digo estranheza por estarmos habituados a outro estilo de vida.
Para mim, a característica que mais chamou a atenção quando me mudei para a Suíça e comecei a me relacionar com as pessoas locais foi o cuidado que eles têm em seguir as regras. Sejam regras de boa convivência, de trânsito, de horários, qualquer uma.
Eu, mesmo sendo a pessoa sistemática que sou (sim, alguns me classificam dessa forma por eu gostar de regras), ainda custo a me habituar com algumas delas e me pego, às vezes, "fazendo brasileirices".
O melhor exemplo de todos está no trânsito. Já atravessei fora da faixa de pedestres (que aqui é amarela) e fui fuzilada por olhares nativos recriminadores. Também - muitas vezes - fiquei plantada na calçada, em frente à mesma faixa, esperando os carros pararem por pensar "Vai que algum desavisado não para!". Mas os suíços não! Eles nem olham do lado quando vão atravessar a rua. Simplesmente confiam nos motoristas, que sempre param para o pedestre que atravessa na faixa. Só porque eles TÊM que parar.
Como eles chegaram nesse ponto? Ah... Podemos pensar na qualidade da educação, claro! E no tamanho da multa que eles pagarão se não respeitarem tais regras! Sim, isso deve mesmo influenciar a conduta. Mas, se você for observar, é uma questão simples de respeito ao outro, aos direitos do outro. E eles levam isso muito a sério.
Isso pode até ser ensinado nas escolas, seu descumprimento pode até ser punido com multas altas, mas é fundamentalmente uma questão cultural. Eles pensam no coletivo mais do que nós. Não passa pela cabeça de um suíço, por exemplo, não comprar o ticket do trem só porque ninguém vai cobrá-lo. É preciso comprar o ticket e pronto! Não passa pela cabeça de um suíço atravessar fora da faixa de pedestres porque a ela está lá para isso!
No Brasil, sinto que nossa sociedade ainda engatinha nessas questões. Quantas vezes nos sentimos envergonhados por fazer a coisa certa? E - de novo - não acho que seja somente pela educação de má qualidade não. É uma questão cultural.
É frequente vermos carros caros e de último modelo seguindo pelo acostamento quando estamos parados em um congestionamento. Será que essa pessoa não teve acesso à escola?
O povo brasileiro em geral se orgulha da sua característica de dar "um jeitinho" pra tudo. Isso nem sempre é bom. Não é bom quando invadimos os direitos do outro. Não é bom quando esse "jeitinho" vai contra o coletivo. Tudo o que vai contra o coletivo impede uma sociedade de se desenvolver. Óbvio.
Falando de boa conduta no trânsito, a Organização Mundial de Saúde (OMS) proclamou a década em que vivemos como a “Década de Ações para a Segurança no Trânsito". De acordo com seus dados, os países menos desenvolvidos respondem por 90% de todas as mortes no trânsito. O Brasil está em 5o lugar nesse ranking.
Por conta dessa recomendação, diversos países estão iniciando ações educativas e punitivas para melhorar o trânsito e diminuir seus índices e gastos com acidentes. Em São Paulo, nesse último dia 8, os motoristas que não respeitarem os pedestres passam a ser multados.
Essa regra já existia, mas não era respeitada pela falta de fiscalização. Quem vai ser trouxa de parar para o pedestre? Eles que esperem ou comprem um carro! Muita gente ainda pensa assim. Nesse caso, o jeito triste de mudar nossa cultura é com a punição. Que seja.
Podemos colaborar com nossa cultura dando exemplos. Basta deixarmos de nos envergonhar por querer atravessar somente na faixa, por não querer dirigir depois de beber, ou talvez respeitando os horários (13 horas não é o mesmo que 13:15!). Não aprendemos isso na faculdade, nós simplesmente sabemos. Se perdermos a vergonha, outros podem começar a achar cool respeitar o coletivo.

Um comentário:

  1. Ótima a sua reflexão! Isso é ética, ou seja, um esforço intelectual coletivo para encontrar a melhor maneira de viver. A palavra mágica é: COLETIVO. E de fato, desconhecida por grande parte dos brasileiros, independente de grau de instrução ou poder aquisitivo. Resta então, reprimir, até conseguir introjetar a regra e passar a ser algo natural, cultural.

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