segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Observar e Pensar (Fonte: www.kanitz.com.br)

O primeiro passo para aprender a pensar, curiosamente, é aprender a observar. Só que isso, infelizmente, não é ensinado. Hoje nossos alunos são proibidos de observar o mundo, trancafiados que
ficam numa sala de aula, estrategicamente colocada bem longe do dia-a-dia e da realidade. Nossas escolas nos obrigam a estudar mais os livros de antigamente
do que a realidade que nos cerca. Observar, para muitos professores, significa ler o que os grandes intelectuais do passado observaram – gente como Rousseau, Platão ou Keynes. Só que esses grandes pensadores seriam os primeiros a dizer "esqueçam
tudo o que escrevi", se estivessem vivos. Na época
não existia internet nem computadores, o mundo era totalmente diferente. Eles ficariam chocados se soubessem que nossos alunos são impedidos de observar o mundo que os cerca e obrigados a ler teoria escrita 200 ou 2.000 anos atrás – o que leva os jovens de hoje a se sentir alienados, confusos e sem respostas coerentes para explicar a realidade.

Não que eu seja contra livros, muito pelo contrário. Sou a favor de observar primeiro, ler depois. Os livros, se forem bons, confirmarão o que você já suspeitava. Ou porão tudo em ordem, de forma esclarecedora. Existem livros antigos maravilhosos, com fatos que não podem ser esquecidos, mas precisam ser dosados com o aprendizado da observação.

Ensinar a observar deveria ser a tarefa número 1 da educação. Quase metade das grandes descobertas científicas surgiu não da lógica, do raciocínio ou do uso de teoria, mas da simples observação, auxiliada talvez por novos instrumentos, como o telescópio, o microscópio, o tomógrafo, ou pelo uso de novos algoritmos matemáticos. Se você tem dificuldade de raciocínio, talvez seja porque não aprendeu a observar direito, e seu problema nada tem a ver com sua cabeça.

Ensinar a observar não é fácil. Primeiro você precisa eliminar os preconceitos, ou pré-conceitos, que são a carga de atitudes e visões incorretas que alguns nos ensinam e nos impedem de enxergar o verdadeiro mundo. Há tanta coisa que é escrita hoje simplesmente para defender os interesses do autor ou grupo que dissemina essa idéia, o que é assustador. Se você quer ter uma visão independente, aprenda correndo a observar você mesmo.

Sou formado em contabilidade e administração. A contabilidade me ensinou a observar primeiro e opinar (muito) depois. Ensinou-me o rigor da observação, da necessidade de dados corretamente contabilizados, e também a medir resultados, a recusar achismos e opiniões pessoais. Aprendi ainda estatística e probabilidade, o método científico de chegar a conclusões, e finalmente que nunca teremos certeza de nada. Mas aprendi muito tarde, tudo isso me deveria ter sido ensinado bem antes da faculdade.

Se eu fosse ministro da Educação, criaria um curso obrigatório de técnicas de observação, quanto mais cedo na escala educacional, melhor. Incentivaria os alunos a estudar menos e a observar mais, e de forma correta. Um curso que apresentasse várias técnicas e treinasse os alunos a observar o mundo de diversas formas. O curso teria diariamente exercícios de observação, como:

1. Pegue uma cadeira de rodas, vá à escola com ela por uma semana e sinta como é a vida de um deficiente físico no Brasil.

2. Coloque uma venda nos olhos e vivencie o mundo como os cegos o vivenciam.

3. Escolha um vereador qualquer e observe o que ele faz ao longo de uma semana de trabalho. Observe quanto ele ganha por tudo o que faz ou não faz.

Quantas vezes não participamos de uma reunião e alguém diz "vamos parar de discutir", no sentido de pensar e tentar "ver" o problema de outro ângulo? Quantas vezes a gente simplesmente não "enxerga" a questão? Se você realmente quiser ter idéias novas, ser criativo, ser inovador e ter uma opinião independente, aprimore primeiro os seus sentidos. Você estará no caminho certo para começar a pensar.
Stephen Kanitz é administrador por Harvard (www.kanitz.com.br)
Revista Veja, Editora Abril, edição 1865, ano 37, nº 31, 4 de agosto de 2004, página 18

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Lidar com pessoas começa com "ler" as pessoas

Se você vive em uma ilha deserta, provavelmente esse tema não lhe seja interessante. Mas se você vive em sociedade, deve lidar com pessoas constantemente, seja no trabalho, na vida pessoal, em viagens.
Porém, uma vez que somos tão distintos uns dos outros, nem sempre isso é tão simples. Se fosse, os cursos de gestão de pessoas não ministrariam aulas e aulas sobre "como lidar com pessoas". Aliás, essa é a maior dificuldade dos gestores de hoje.
Mas não precisamos ir longe. No nosso dia a dia - até na nossa família! - enfrentamos dificuldades. Não temos paciência com um, subestimamos o outro, queremos impor nossas idéias de forma rápida e a força, temos resistência em aceitar opiniões diversas... e por aí vai. Esses são só alguns exemplos do que fazemos rotineiramente de forma instintiva.
Isso porque não temos interesse em interagir de forma mais plena, de fazer exercício de paciência, de ter compreensão das circunstâncias, de revermos nossa forma de apresentação de idéias para que elas sejam mais adequadas àquela pessoa ou àquela ocasião. Ou mesmo por falta de traquejo social.
Observando situações de convivência - bem e mal sucedidas e de qualquer espécie - posso citar 4 atitudes que foram fundamentais para o sucesso ou fracasso dessa interação:
         ouvir: essa é a parte fácil; é bom lembrar que outras pessoas também podem nos ensinar algo se tivermos paciência de ouvi-las; muitas vezes elas só precisam ser ouvidas, não precisamos dar nada em troca.
        entender: é preciso entender a posição do outro, sua história de vida (sua "bagagem"), suas motivações e suas aspirações; é fundamental entender esse contexto, pois tudo pode ter 2 lados e até mais.
         aceitar: nem sempre concordamos com aquilo que vemos ou que ouvimos, mas temos que pensar que quase sempre temos uma visão parcial de tudo. Podemos opinar com nossa visão parcial, sim, mas nem sempre temos o direito de interferir - e isso não é omissão; temos que aceitar o livre arbítrio do outro.
         respeitar: é saber ouvir, entender e aceitar.
Então, para lidarmos com pessoas, temos que ouvir calados? Não! Temos que ter maturidade para processar todas essas informações obtidas (do que ouvimos, do que vemos, do que entendemos da "bagagem" que cada um traz, das circunstâncias...) e então emitir nossa posição de forma clara e sem imposições, para dar ao outro a chance de se defrontar com outro pensar e se permitir fazer mais reflexões. A decisão de mudar é do outro e não nossa. Se não nos agrada é outra história.
Para isso se tornar mais simples, a observação é fundamental. Comece a observar pessoas, a ver como agem, porque agem, observe suas feições, seus gestos, o tom da fala. É como ler nas entrelinhas.
Resumindo, as pessoas só precisam ser lidas.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Sem vergonha de respeitar

Quando pensamos em uma sociedade desenvolvida, logo nos vem à cabeça o bom nível de vida da população decorrente de boa estrutura de saneamento, saúde, educação, transporte, etc.
No entanto, ao observar essa sociedade no dia-a-dia, características mais simples nos causam estranheza. Digo estranheza por estarmos habituados a outro estilo de vida.
Para mim, a característica que mais chamou a atenção quando me mudei para a Suíça e comecei a me relacionar com as pessoas locais foi o cuidado que eles têm em seguir as regras. Sejam regras de boa convivência, de trânsito, de horários, qualquer uma.
Eu, mesmo sendo a pessoa sistemática que sou (sim, alguns me classificam dessa forma por eu gostar de regras), ainda custo a me habituar com algumas delas e me pego, às vezes, "fazendo brasileirices".
O melhor exemplo de todos está no trânsito. Já atravessei fora da faixa de pedestres (que aqui é amarela) e fui fuzilada por olhares nativos recriminadores. Também - muitas vezes - fiquei plantada na calçada, em frente à mesma faixa, esperando os carros pararem por pensar "Vai que algum desavisado não para!". Mas os suíços não! Eles nem olham do lado quando vão atravessar a rua. Simplesmente confiam nos motoristas, que sempre param para o pedestre que atravessa na faixa. Só porque eles TÊM que parar.
Como eles chegaram nesse ponto? Ah... Podemos pensar na qualidade da educação, claro! E no tamanho da multa que eles pagarão se não respeitarem tais regras! Sim, isso deve mesmo influenciar a conduta. Mas, se você for observar, é uma questão simples de respeito ao outro, aos direitos do outro. E eles levam isso muito a sério.
Isso pode até ser ensinado nas escolas, seu descumprimento pode até ser punido com multas altas, mas é fundamentalmente uma questão cultural. Eles pensam no coletivo mais do que nós. Não passa pela cabeça de um suíço, por exemplo, não comprar o ticket do trem só porque ninguém vai cobrá-lo. É preciso comprar o ticket e pronto! Não passa pela cabeça de um suíço atravessar fora da faixa de pedestres porque a ela está lá para isso!
No Brasil, sinto que nossa sociedade ainda engatinha nessas questões. Quantas vezes nos sentimos envergonhados por fazer a coisa certa? E - de novo - não acho que seja somente pela educação de má qualidade não. É uma questão cultural.
É frequente vermos carros caros e de último modelo seguindo pelo acostamento quando estamos parados em um congestionamento. Será que essa pessoa não teve acesso à escola?
O povo brasileiro em geral se orgulha da sua característica de dar "um jeitinho" pra tudo. Isso nem sempre é bom. Não é bom quando invadimos os direitos do outro. Não é bom quando esse "jeitinho" vai contra o coletivo. Tudo o que vai contra o coletivo impede uma sociedade de se desenvolver. Óbvio.
Falando de boa conduta no trânsito, a Organização Mundial de Saúde (OMS) proclamou a década em que vivemos como a “Década de Ações para a Segurança no Trânsito". De acordo com seus dados, os países menos desenvolvidos respondem por 90% de todas as mortes no trânsito. O Brasil está em 5o lugar nesse ranking.
Por conta dessa recomendação, diversos países estão iniciando ações educativas e punitivas para melhorar o trânsito e diminuir seus índices e gastos com acidentes. Em São Paulo, nesse último dia 8, os motoristas que não respeitarem os pedestres passam a ser multados.
Essa regra já existia, mas não era respeitada pela falta de fiscalização. Quem vai ser trouxa de parar para o pedestre? Eles que esperem ou comprem um carro! Muita gente ainda pensa assim. Nesse caso, o jeito triste de mudar nossa cultura é com a punição. Que seja.
Podemos colaborar com nossa cultura dando exemplos. Basta deixarmos de nos envergonhar por querer atravessar somente na faixa, por não querer dirigir depois de beber, ou talvez respeitando os horários (13 horas não é o mesmo que 13:15!). Não aprendemos isso na faculdade, nós simplesmente sabemos. Se perdermos a vergonha, outros podem começar a achar cool respeitar o coletivo.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Você já observou?

Reparar, observar, refletir, ponderar, aprender, crescer. Um levando ao outro: o reparar de "ponhar reparo" ao reparar de recondicionar, de rever conceitos e ações.
Quero dizer que observar as coisas, as pessoas, as ações e nós mesmos pode nos ajudar a reparar outras coisas, resolver outros problemas, ajudar outras pessoas e até nós mesmos.
O mundo tá aí pra nos ensinar. Bora reparar na vida, olhar em volta com os olhos de poeta. Esses são os olhos que não só olham, mas que vêem. Precisamos ter olhos de poeta pra enxergar nas entrelinhas e não ter medo de refletir. Refletir sobre as decisões tomadas, sobre os sentimentos desencadeados, sobre as reações obtidas.
Viver sem observar é ser levado pela vida.
Muitas vezes o aprendizado não é fácil: exige coragem para rever certos conceitos, ritos, crenças e quebrar a inércia. É aí que crescemos um tantinho.
Reparar não é tudo. Mas pode ser o primeiro passo.
Eu "ponho reparo". Se eu enxergo, penso, repenso, aprendo e cresço, só a vida vai poder dizer.