quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Redescobrindo utilidades, em busca da boa saúde mental - mesmo sem emprego

Nesse primeiro mês de expatriação vivemos ainda fora da rotina. Há muito por fazer. Temos uma casa inteira pra montar e remontar, um novo idioma a aprender, lugares novos a descobrir. Aos poucos, tudo vai entrando nos eixos.
No entanto, um conflito começa a perturbar: deixei meu trabalho lá... E agora?
Apesar de ser um conflito muito pessoal, tenho certeza de que há mais mulheres e maridos que já passaram ou vão passar por isso.

Antes de me mudar pra cá, tinha a rotina normal de qualquer trabalhador empregado: trabalhava muito, vivia agitada para dar conta do volume de coisas, ansiosa para sempre conseguir encontrar a melhor solução para os problemas e com um cansaço tão frequente que me impedia até de encontrar os amigos mais queridos. Meu jeito... Para quem ama muito seu trabalho, isso não deve ser um problema. Mas para mim meu trabalho nunca foi exatamente uma paixão.
Hoje me sinto mais feliz, mais livre, sinto até que voltei a pensar... Sim! Tenho a impressão que o excesso de trabalho aos moldes do que eu tinha antes ocupava todos os campos da minha cabeça, não deixando espaço para reflexões simples porém necessárias sobre a vida. Tudo por conta da minha - não culpo o emprego, que era bom -  dificuldade de apertar o Off.
Então... Por que isso agora?
Acho que porque sei que as pessoas são valorizadas e admiradas pelo seu emprego ou pela posição que ocupam no mercado. Talvez medo de ser visto como um ser inútil, acomodado. Meu temperamento não suportaria isso.
Mas, se formos observar, tendemos a confundir trabalho com emprego. O trabalho é o uso das nossas habilidades físicas ou intelectuais para produzir ou transformar algo. Já o emprego é a relação de troca, da troca de um serviço (trabalho) por uma remuneração, nos dando um cargo e um salário.
Conheço pessoas com cargo e salário importantes e que são com-ple-ta-men-te inúteis para a sociedade por produzirem apenas pensando em seu próprio bem-estar financeiro. Conheço também pessoas que não possuem cargo e (muito menos) salário, mas que conseguem ajudar e contribuir com a comunidade de forma sem igual. Não é um julgamento, apenas uma constatação de que um emprego de renome não necessariamente contribui mais para a humanidade do que um ato, idéia ou exemplo de alguém bem intencionado.
Partindo daí, o que de fato deve ser valorizado, o trabalho ou o emprego? A questão não é ter um emprego - ou não. Mas sim se produzimos e contribuímos para algo maior - ou não!
"Lieben und arbeiten". É dito que essa foi a resposta de Freud ao ser perguntado sobre o que uma pessoa deveria ser capaz de fazer bem. Ou seja, para Freud, uma pessoa tem boa saúde mental quando ela é capaz de amar e de trabalhar.
Amar no sentido de compartilhar, de se entregar, de reconhecer e ser reconhecido. Trabalhar no sentido de ser criativo, produtivo, útil.
Se amamos e não criamos, não produzimos, nos sentimos inúteis e infelizes. Em contrapartida, se trabalhamos a ponto de não termos tempo para amar, nossa vida então é inútil e nós, também infelizes.
Nos dias de hoje, com o status corporativo sendo mais valorizado que o amor e o trabalho, temos um cenário de saúde mental em declive. Vejo aqui na vida de muitos expatriados, exemplos de maridos enfurnados em escritórios, incapazes de amar e compartilhar da "vida exterior" e mulheres enfurnadas em suas novas casas, intimidadas pelo novo idioma, com pensamento fixo na falta do arroz com feijão e incapazes de uma produção criativa, mesmo que isenta de um cargo e salário.
Pode ser esse o bicho-papão das famílias expatriadas: uns com tanto trabalho, outros com tão pouco...
Conseguimos nos livrar dele se pudermos enxergar a tênue linha que equilibra amor e trabalho, que nos faz sermos verdadeiramente úteis e que faz com que nossa saúde mental permaneça em níveis aceitáveis.
Espero que eu e todos os outros que vivem essa situação consigamos enxergar essa linha - e vivenciá-la!
Nós, expatriados, temos sorte, pois temos a chance que poucos têm de rever nossas vidas, nossos objetivos e mudar a rotina. Podemos nos tornar úteis e criativos de forma não convencional.
Vamos aproveitar, aprender, produzir e compartilhar!
Pensando assim, conflito resolvido.

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